Justiça condena estado a indenizar homem preso por crime que não cometeu: ‘chorava dia e noite’


Leandro de Araújo Mariano, de 38 anos, ficou preso após ter o RG usado por um criminoso durante uma tentativa de furto a um hotel em Praia Grande. Ao g1, o homem revelou ainda sofrer traumas pelo tempo na cadeia. Leandro chegou a ter o cabelo raspado (à esquerda) na cadeia. Hoje ele ainda tem traumas.
Arquivo Pessoal
A Fazenda Pública do Estado de São Paulo foi condenada a pagar uma indenização de R$ 14 mil a um morador de São Vicente (SP), no litoral de São Paulo, que ficou preso por quatro dias acusado de uma tentativa de furto que não cometeu. Segundo a decisão, obtida pelo g1, o autônomo Leandro de Araújo Mariano, de 38 anos, deverá ser indenizado por danos morais. Ainda cabe recurso.
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Mariano foi preso no dia 2 de março de 2020 enquanto buscava atendimento no Poupatempo de São Vicente. Na ocasião, ele foi surpreendido com um mandado de prisão preventiva por uma tentativa de furto que tinha acontecido em um hotel de Praia Grande em 2016.
“Falaram que eu estava sendo procurado pela polícia. Eu perguntei o motivo, mas foram super ignorantes, falaram que eu era bandido e que todo bandido fala que nunca fez nada. Me levaram para uma sala algemado, na frente de todo mundo. Foi muito constrangedor e eu sem saber o que estava acontecendo”, relembrou Leandro, em entrevista ao g1.
O homem foi encaminhado para a Cadeia Pública de Santos, anexa ao 5º DP. Depois, ele foi encaminhado para o Centro de Detenção Provisória (CDP) de São Vicente, onde permaneceu até o dia 5 de março, quando recebeu o alvará de soltura.
Durante o processo, a defesa de Leandro conseguiu provar que ele era inocente e que, na verdade, o homem que tentou arrombar e furtar o hotel estava usando o RG de Leandro, que havia sido furtado.
Confusão de RGs
Leandro havia perdido o RG em abril de 2016. Ele chegou a registrar um boletim de ocorrência (BO) pela perda e fazer um novo. Porém, o antigo foi apresentado à polícia em dezembro do mesmo ano, quando um homem preso em flagrante por tentativa de furto se identificou como Leandro e chegou a assinar documentos no nome dele.
Na ocasião, o desconhecido – ainda não identificado – foi liberado. No entanto, um processo criminal foi instaurado com o nome de Leandro, que estava sendo procurado pela polícia sem saber.
“Embora tenha sido juntada uma certidão de RG bloqueado por extravio no auto de prisão em flagrante delito, a autoridade policial não determinou a identificação criminal do homem que foi apresentado como determina a lei, e que indevidamente acabou sendo qualificado como sendo o senhor Leandro de Araújo Mariano”, explicaram os advogados Marcelo Pupo Estevan Tocci e Diego Renoldi Quaresma de Oliveira, em nota.
Ao g1, Diego Renoldi, contou que houve uma sucessão de erros da Polícia Civil e, em seguida, do Ministério Público (MP), que ofereceu a denúncia contra Leandro. “Houve um erro sucessivo do sistema de justiça criminal que acabou colocando o Leandro indebitamente preso e respondendo equivocadamente e erroneamente a ação penal”.
O processo foi anulado e a denúncia rejeitada após Leandro apresentar álibi do dia do crime e uma perícia grafotécnica demonstrar não ser ele quem assinou o auto de prisão em flagrante em 2016.
Leandro de Araújo ficou preso em São Vicente, onde mora.
Arquivo Pessoal
Reflexos
Ao g1, Leandro informou que até hoje tem lembranças e traumas dos dias que passou preso, seja no DP ou no CDP. “Rasparam minha cabeça, me deixaram com 35 homens dentro de uma cela”, afirmou o autônomo. Ele contou que foi padrinho do casamento da sobrinha dias depois e precisou participar da cerimônia sem cabelo, para o qual já tinha até pago penteado.
“Eu chorava dia e noite lá dentro […]. Foi um sofrimento muito grande, eu não desejo isso para ninguém, porque é um inferno, é horrível”, destacou Leandro.
Além do constrangimento, o autônomo se endividou pelos dias que ficou sem trabalhar e passou a ter medo de policiais. “Eu tinha pavor de ver polícia na rua. Parecia que ia acontecer tudo de novo”.
Indenização
Apesar do trauma, o caso ganhou um novo capítulo nessa semana, quando o juiz Carlos Eduardo D’Elia Salvatori publicou a decisão de que o Estado de São Paulo deveria pagar uma indenização por danos morais a Leandro.
“O que eu queria era meu nome estar limpo, porque eu nunca tive nenhum problema com a Justiça. Hoje, eu fico muito grato de saber que foi reconhecido que eu não tenho nada a ver com isso. Tenho gratidão, graças a Deus”, finalizou.
Procurada pelo g1, a Procuradoria Geral do Estado informou que recorreu da sentença.
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