
Durante sua passagem por Palmas para o Encontro Formativo de Educação Antirracista do Tocantins, a filósofa, escritora e pesquisadora Djamila Ribeiro conversou com exclusividade com a jornalista Maju Cotrim, editora-chefe da Gazeta do Cerrado, sobre a importância da implementação de políticas públicas duradouras no enfrentamento ao racismo estrutural no Brasil. O evento, realizado no Centro de Convenções Arnaud Rodrigues, é promovido pela Secretaria Estadual da Educação (Seduc-TO) e reuniu educadores de todo o estado.
Ao ser questionada sobre os avanços na educação antirracista, Djamila destacou que, apesar de conquistas como a Lei 10.639/03 — que torna obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira nas escolas —, os desafios persistem, principalmente por conta da descontinuidade de políticas públicas.
“É um caminho longo ainda. Por mais que a lei exista, se entra um governo que não está comprometido com isso, a aplicação se torna muito difícil. A nossa luta é para que isso se torne política de Estado, e não apenas de governo. Isso precisa ser respeitado independentemente de quem estiver no poder”, defendeu.
Tocantins como exemplo
Djamila celebrou a iniciativa do Tocantins em realizar o encontro e reforçou que o estado, com uma população majoritariamente negra, tem responsabilidade histórica de protagonizar ações de valorização dessa identidade nas escolas.
“É um estado com 76% da população negra. Essa história precisa ser contada nas escolas. A população negra precisa ser vista como sujeito histórico, e não apenas como coadjuvante ou vítima.”
Ela também afirmou que o evento promovido pela Seduc deveria servir de exemplo para outras regiões do país:
“Espero que essa iniciativa do Tocantins seja replicada em muitos outros estados. Formação de educadores é algo que valorizo muito e faço questão de participar sempre que possível. O debate sobre educação antirracista precisa ser contínuo, estruturado e baseado em políticas públicas concretas.”
“Estamos falando mais, mas fazendo menos”
A pesquisadora também comentou sobre o momento atual do Brasil no debate racial. Para ela, há mais espaço para discussão, mas a ação concreta ainda é tímida diante do tamanho do problema:
“As pessoas estão falando mais, o que já é um avanço, mas ainda falta estrutura. Quando eu era criança, o racismo era totalmente naturalizado. Hoje, ao menos, é mais debatido. Mas isso é resultado da luta histórica do povo negro, e precisamos seguir vigilantes e mobilizados.”
Lugar de Fala e novos projetos
Reconhecida pelo livro “Lugar de Fala”, Djamila revelou que está preparando uma versão ampliada da obra, com atualizações sobre os desdobramentos do conceito que ganhou espaço no Brasil e no mundo. O relançamento está previsto ainda para este ano.
Reconhecimento e visibilidade
Durante a entrevista, Djamila também celebrou o papel da Gazeta do Cerrado como veículo de comunicação comprometido com as pautas sociais. Ela elogiou o trabalho da jornalista Maju Cotrim, uma das poucas editoras-chefes negras do Brasil, e destacou a importância de uma mídia que amplifique vozes historicamente marginalizadas:
“A Gazeta é essencial para o Tocantins. A comunicação precisa amplificar as vozes que historicamente foram silenciadas. As comunidades quilombolas, os povos indígenas e tantas outras precisam ser ouvidas. Vocês não estão apenas fazendo jornalismo, estão fazendo história.”