Em rota de colisão

A certa altura de Quatro marchas, mais recente livro de ficção do santa-cruzense Rudinei Kopp (publicado pela Editora Gazeta), um dos personagens sente que uma tempestade está prestes a acontecer. Ou seria um terremoto? “Algum fenômeno virá e não será manso. Meus olhos já viram o horizonte.”

Toda boa história se desenrola a partir de uma crise, e essa não é diferente. Três personagens vivem um momento particular de ruptura e mudança, tendo como pano de fundo um país que também é cenário de impasses e divergências profundas, aparentemente inconciliáveis. A incompreensão geral invade a esfera pessoal, perturba afetos, decide vidas.

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A narrativa de Quatro marchas é contada por cada um dos três (quatro, na verdade), todos narradores, numa polifonia – termo vindo do grego que significa “várias vozes” – que me lembrou outro romance lido há alguns dias: Atos humanos, da sul-coreana Han Kang, Nobel de Literatura deste ano. A diferença é que, aqui, a tempestade (no sentido figurado, ou desfigurado, da palavra) já veio e deixou grande destruição. Aquilo que era preciso evitar a todo custo, a estupidez imperdoável da violência fratricida, da política rebaixada ao nível do crime hediondo, consumou-se. E os que restaram se perguntam: como chegamos a tanto?

Não vou entrar em detalhes sobre tramas muito menos comparar textos, mas indico Quatro Marchas, melhor romance de Rudinei Kopp até agora (após Rio dos dias, Oto e Isac e Contraforte) e Atos humanos, pois acho que conversam de algum modo. E é claro que você pode ler e considerar bobagem da minha cabeça. Que raios tem a Coreia do Sul a ver com o Brasil e Santa Cruz? Bebeu de novo?

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Política, tudo é política, embora no início não pareça. Mas verdade seja dita, não há heróis nem vilões no livro de Kopp: todos são parte do problema, até quem pensa não ter nada a ver. Ou pensa não ver “a vontade não mais escondida de eliminar a diferença pela aniquilação, a noção de que existem os fins certos e para alcançá-los qualquer método é válido”.

“Cada um é sacudido nas suas serenas convicções”, como está dito na apresentação. E isso é ótimo.

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