
Levantamento documenta 205 espécies de vertebrados em fragmento de 53 hectares, incluindo onças-pardas e araras-canindé que possivelmente migraram após as queimadas. Gato-do-mato-do-sul (Leopardus guttulus) registrado na área
Fábio Motta
A Serra dos Cocais, região de vales e morros que abraça os municípios paulistas de Valinhos, Vinhedo, Louveira e Itatiba, esconde uma biodiversidade que sobrevive entre ameaças históricas e incêndios florestais cada vez mais frequentes.
Um novo levantamento conduzido entre julho e dezembro de 2024 revelou um número impressionante: 205 espécies de vertebrados foram registradas em uma área que representa menos de 1% do território total de 13 mil hectares da serra.
O estudo, liderado pelo biólogo e educador ambiental Fábio Motta, também presidente do Instituto Serra dos Cocais (ISC), aponta que as aves lideram em diversidade, com 144 espécies, seguidas por mamíferos, répteis e anfíbios.
Sauá (Callicebus nigrifrons) registrado na área
Fábio Motta
O dado que mais chama a atenção, no entanto, está no status de conservação dos animais: 34% dos mamíferos registrados estão ameaçados de extinção em níveis estadual, nacional ou global.
Criado em resposta aos incêndios de 2024, o ISC é organizado por pesquisadores, ambientalistas e voluntários para proteger o patrimônio ambiental da serra, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida das populações humanas e não humanas da região.
Novas espécies após os incêndios
Entre os novos registros, estão espécies como a onça-parda (Puma concolor), o gato-maracajá (Leopardus wiedii), o veado-mateiro (Mazama rufa) e a arara-canindé (Ara ararauna). Algumas migraram para a área de estudo, uma floresta de 53 hectares, após o incêndio que devastou a Serra dos Cocais em setembro de 2024.
Rã-quatro-olhos (Physalaemus nattereri) registrada na área
Fábio Motta
“Isso não apenas causou a morte dos animais e destruiu seus habitats, mas também alterou suas rotas naturais utilizadas para buscar recursos como água e alimento, procurar parceiros para reprodução e outras atividades”, explica Fábio Motta.
Mesmo durante as queimadas de setembro de 2024, a pesquisa na Serra dos Cocais continuou e revelou dezenas de novas espécies. As chuvas favoreceram o aparecimento de répteis, anfíbios e 38 aves inéditas.
O destaque foram os mamíferos: sete novas espécies registradas, cinco delas ameaçadas de extinção. A hipótese é que o fogo forçou esses animais a migrar para áreas preservadas, como o fragmento de 53 hectares do Centro de Formação e Lazer (Cefol) – onde a pesquisa foi feita.
Ampliação dos estudos
O levantamento também trouxe dados sobre a sensibilidade das espécies às pressões ambientais, como perda de habitat, caça e isolamento ecológico. A meta agora é expandir a pesquisa para uma área de 3 mil hectares (cerca de 60% da cobertura florestal da serra) para criar um retrato ainda mais fiel da biodiversidade local.
“Essas descobertas demonstram quais são as principais ações que precisam ser tomadas para conservar as espécies, como a implementação de passagens de fauna, placas contra a caça, proteção de sítios reprodutivos e outras iniciativas que podem significar a preservação de uma espécie inteira”, diz Motta.
Cobra-verde (Phylodrias olfersii) registrada na área
Fábio Motta
Histórico de monitoramento
Em 2022, Motta havia realizado o primeiro Inventário de Vertebrados Terrestres da Serra em uma área correspondente a apenas 0,5% de todo o território do monumento natural. Em dois meses de amostragem, realizada na época de estiagem, foram registradas 139 espécies de animais entre mamíferos, aves, répteis e anfíbios.
“Tal riqueza de dados demonstrava a necessidade de novos estudos para embasar projetos de conservação da fauna e seus respectivos habitats”, relembra o pesquisador. “Entretanto, o resultado não obteve o impacto social desejado, pois seus dados não foram utilizados para referenciar projetos de lei de proteção à Serra dos Cocais”.
Gambá-de-orelha-preta (Didelphis aurita) registrado na área
Fábio Motta
Dois anos depois, visando compreender como estaria o índice de diversidade da mesma área, um novo estudo foi realizado entre julho e dezembro de 2024. Desta vez, com um período amostral maior, que incluía as estações seca e chuvosa, buscando registrar ainda mais atividade de espécies.
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