O acúmulo anormal de gordura nas pernas e nos braços é uma das principais características do lipedema, doença que pode ser acompanhada por dor e sensibilidade ao toque nas regiões afetadas. A condição é considerada uma doença crônica – ou seja, que se desenvolve lentamente, persistindo por um longo período.
Um estudo de 2020 publicado no periódico Deutsches Ärzteblatt destacou que há relatos de lipedema em homens. No entanto, a enfermidade afeta, principalmente, as mulheres. Conforme uma pesquisa do Jornal Vascular Brasileiro, publicado na Scientific Electronic Library Online (SciELO), 12,3% das brasileiras sofrem com a condição.
De acordo com Antônio Vasconcelos de Lima Filho, cirurgião vascular e endovascular, quando se trata do lipedema a sua cura ainda é desconhecida. Quando o quadro é identificado, o paciente precisa seguir um tratamento que engloba várias medidas.
“O lipedema é uma condição dolorosa, podendo comprometer a qualidade de vida e gerar impactos psicológicos”, diz. Também professor de Cirurgia Vascular e Bases da Técnica Cirúrgica e Anestesiologia da UNIPÊ-Cruzeiro do Sul, Antônio fala que hematomas espontâneos são outros sintomas da doença. Esse sinal é um “reflexo da fragilidade dos vasos sanguíneos e da inflamação presente nos tecidos”.
Ele também comenta que, no grupo feminino, os sintomas costumam surgir ou se intensificar em períodos de grande alteração hormonal, como na adolescência, gravidez e menopausa. A pesquisa na SciELO estimou que 8,8 milhões de mulheres adultas brasileiras, entre 18 e 69 anos, podem ser portadoras dos sintomas do diagnóstico de lipedema.
Principais causas do lipedema
Nos quadros de lipedema, as mãos e os pés não costumam ser afetados pela distribuição desproporcional de gordura. É o que dizem os pesquisadores do artigo no periódico Deutsches Ärzteblatt. Além disso, os estudiosos do artigo do Jornal Vascular Brasileiro, também na SciELO, observaram uma relação da ansiedade, depressão, hipertensão arterial e anemia com a doença.
No entanto, Antônio lembra que as causas exatas do lipedema ainda não são totalmente compreendidas. O que se sabe é que diversos fatores podem estar associados ao seu desenvolvimento e agravamento, como:
- Fatores hormonais: “O lipedema acomete quase que exclusivamente as mulheres, sugerindo uma forte influência dos hormônios femininos.”
- Alterações microvasculares: “Disfunções nos vasos sanguíneos e linfáticos podem estar presentes, favorecendo o aparecimento de edemas (inchaços) e equimoses (manchas roxas espontâneas).”
- Fatores genéticos: “Há uma tendência familiar importante, indicando que o lipedema pode ser herdado geneticamente, passando de uma geração para outra.”
Ainda, o especialista ressalta que “o lipedema não é causado por maus hábitos ou por um vírus, mas sim por uma condição clínica específica que precisa ser reconhecida e tratada de forma individualizada”.
Relação entre o lipedema e a genética
Diferentes familiares podem apresentar a enfermidade, indicando a possibilidade da presença de um componente genético na sua origem. O professor e cirurgião vascular Antônio Vasconcelos de Lima Filho diz que esses casos são observados com frequência.
“Alguns trabalhos científicos demonstram que cerca de 40% das pacientes relatam sintomas semelhantes nas mães”, comenta. “Acredita-se que múltiplos genes possam estar envolvidos na transmissão da doença, embora os mecanismos genéticos exatos ainda não estejam totalmente compreendidos”.
Com isso, é preciso a elaboração de mais estudos científicos para auxiliarem no compreendimento da relação entre genética e lipedema. No entanto, o cirurgião vascular destaca o seguinte: “a predisposição familiar é um dado importante que reforça a influência hereditária no desenvolvimento do lipedema”.
Por que o lipedema pode ser confundido com varizes ou celulite?
Por possuírem alguns sinais semelhantes, algumas condições podem acabar sendo confundidas com o lipedema, como varizes e celulite. No entanto, cada caso é totalmente diferente um do outro.
As varizes são veias dilatadas e tortuosas e com funcionamento comprometido, dificultando o retorno do sangue ao coração, como explica Antônio. Esse quadro pode ser interpretado erroneamente como lipedema por conta de seus efeitos no corpo, que são: sensação de peso, cansaço e dor nas pernas.
Mas a diferença é que as varizes se tratam de uma doença que acomete as veias. Já o lipedema afeta a gordura, como explica o especialista.
Em relação à celulite, Antônio diz que na medicina esse termo se refere a uma infecção bacteriana da pele, acompanhada de vermelhidão, inchaço, aumento da temperatura local e dor. “Trata-se de um quadro sério, que exige tratamento com antibióticos”, aponta.
Porém, a expressão “celulite” é popularmente associada a ondulações ou “furinhos” na pele, com aspecto de casca de laranja. “Na verdade, essa condição é chamada ‘lipodistrofia ginoide’”, esclarece Antônio.
“Ela está relacionada ao acúmulo de gordura sob a pele, especialmente em coxas, quadris e nádegas. Por também envolver o tecido adiposo [gordura], pode haver confusão com o lipedema. Mas são casos diferentes”.
Antônio acrescenta a possibilidade dessas três condições se manifestarem no corpo ao mesmo tempo em um paciente. “Por isso, o diagnóstico correto e individualizado é fundamental para definir o melhor tratamento para cada caso”.
Lipedema e linfedema: quais são as diferenças?
No estudo publicado na Scientific Electronic Library Online (SciELO) que foi citado acima, os pesquisadores escreveram que o lipedema ainda é bastante confundido com outras enfermidades recorrentes, como obesidade, lipodistrofia ginoide e linfedema.
Conforme Antônio, o quadro denominado “lipedema” foi relatado pela primeira vez na medicina em 1940. “Alguns pacientes também apresentavam inchaço leve nos membros inferiores. No entanto, como o ‘edema’ foi incluído no nome da doença, existiu um equívoco de que o inchaço é um componente primário do distúrbio, causando confusão e rotulagem incorreta como linfedema”, diz.
Para compreender melhor o caso de linfedema, ele explica o seguinte: “O nosso corpo possui uma rede de vasos muito finos, semelhantes a pequenos ‘canos’, que compõem o sistema linfático. Essa rede é responsável por drenar parte do líquido que circula entre os tecidos, ajudando a manter o equilíbrio de fluidos no organismo. Quando há uma falha nessa drenagem, ocorre um acúmulo de líquido na forma de edema (inchaço), o qual chamamos de linfedema”.
Ainda sobre essa doença, a sua manifestação acontece por meio de um inchaço progressivo, especialmente nos membros. No entanto, esse sintoma tende a ser mais evidente nos pés, região que não costuma ser afetada pelo lipedema. “Além disso, o inchaço causado pelo linfedema, em geral, não é doloroso”, complementa Antônio sobre a diferença entre essa enfermidade e o lipedema.
Ao suspeitar de lipedema, quais especialistas procurar?

O profissional que costuma avaliar o lipedema auxiliará o tratamento mais adequado para cada paciente. (Foto: Freepik).
Em casos de suspeita de lipedema, o primeiro profissional a ser procurado é um cirurgião vascular, pois é nessa especialidade que o caso é avaliado de forma mais abrangente, além da indicação dos caminhos mais adequados para o tratamento.
“O lipedema também exige uma abordagem multiprofissional, uma vez que envolve diferentes sistemas do corpo e impacta diversas áreas da saúde do paciente”, destaca Antônio. Com isso, ele elenca outros profissionais que podem ser incluídos no cuidado da doença e explica a importância de cada um. Confira abaixo:
- Nutricionista: “É importante na construção de planos alimentares específicos, como dietas anti-inflamatórias ou cetogênicas, que podem ajudar a controlar os sintomas da doença.”
- Educador físico: “Contribui com a orientação de atividades físicas adequadas que sejam benéficas e bem toleradas por esses pacientes.”
- Ortopedista: “É importante em casos em que há alterações nas articulações ou problemas osteomusculares, como artroses e desvios articulares, que são relativamente comuns nesses pacientes.”
- Fisioterapeuta: “Auxilia com terapias descongestionantes e uso de técnicas compressivas, especialmente quando há acúmulo de líquido nos membros.”
- Psicólogos e psiquiatras: “Auxilia na abordagem de questões de imagem corporal, bem-estar mental e estratégias de enfrentamento.”
Dependendo de cada caso, outros profissionais podem ser necessários, conforme a avaliação inicial do cirurgião vascular.
Tratamento para lipedema
Geralmente, o tratamento para lipedema não envolve cirurgia, mas, sim, uma série de medidas que auxiliam no controle dos sintomas e na qualidade de vida do paciente. De acordo com Antônio, o tratamento costuma incluir:
- Mudanças no estilo de vida: “Essa medida engloba o foco na perda de peso, com exercícios físicos de baixo impacto, buscando o fortalecimento muscular em atividades como hidroginástica, natação, musculação, caminhada ou ioga. Essa prática ajuda a reduzir o desconforto e melhora a circulação.”
- Alimentação equilibrada: “Nesse caso, priorizam-se alimentos naturais, ricos em antioxidantes, ômega-3 e fibras – como frutas, peixes e grãos integrais –, além de evitar ultraprocessados, açúcares e gorduras saturadas. Essas escolhas ajudam a reduzir a inflamação crônica, com impacto direto nos sintomas.”
- Terapias compressivas: “O uso de meias elásticas adequadas, por exemplo, são úteis para aliviar o inchaço e a sensação de peso nos membros.”
- Acompanhamento psicológico: “Pode ser necessário para lidar com os impactos emocionais e sociais da doença.”
Mas há casos específicos em que uma cirurgia pode ser considerada? A resposta é sim. “As cirurgias mais comuns são: a lipoaspiração, com técnica adequada que pode ser indicada para reduzir dor, melhorar a mobilidade e a função, principalmente em fases mais avançadas; e, em alguns pacientes, com obesidade associada (algo relativamente comum), a cirurgia bariátrica pode ser uma aliada para controle do peso e melhora dos sintomas”, diz Antônio. Mas vale lembrar que cada caso precisa ser avaliado por um especialista para chegar ao melhor caminho para o tratamento.
O que costuma ser feito para desinflamar o lipedema?
O lipedema está relacionado a uma inflamação crônica, de baixo grau, porém persistente. “Atualmente, não há um medicamento específico ou anti-inflamatório indicado para o tratamento da doença”, aponta Antônio.
Por isso, o profissional comenta que o manejo da inflamação costuma ser baseado em medidas integradas, com foco em hábitos de vida saudáveis. As principais estratégias para desinflamar o lipedema incluem:
- Dieta anti-inflamatória;
- Exercícios físicos regulares;
- Controle do estresse e sono de qualidade, pois alterações emocionais e privação de sono podem intensificar os processos inflamatórios do corpo;
- Terapias compressivas, como o uso de meias elásticas apropriadas, que auxiliam na redução do edema (quando presente) e na melhora dos sintomas.
Existem medidas de prevenção contra o lipedema?
Conforme o professor e cirurgião vascular, embora o lipedema tenha uma origem multifatorial, com forte influência genética e hormonal – fatores que não podem ser evitados –, algumas medidas podem, na verdade, ajudar a reduzir o risco de progressão da doença e a aliviar seus sintomas, especialmente nos estágios iniciais. Entre as estratégias mais importantes, ele destaca:
- Manter o peso sob controle;
- Praticar exercícios físicos regularmente, preferencialmente de baixo impacto e com foco no fortalecimento muscular;
- Adotar uma alimentação equilibrada, rica em alimentos naturais e com propriedades anti-inflamatórias.
“Essas medidas não impedem o surgimento do lipedema, mas podem contribuir significativamente para um controle mais eficaz da condição e para uma melhor qualidade de vida”, finaliza Antônio.
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