
Dom João Braz de Aviz, prefeito emérito do Dicastério para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, está entre os sete brasileiros com direito a voto no conclave que se inicia nesta quarta-feira, no Vaticano, para a escolha do novo papa.
Três cardeais brasileiros nascidos em Santa Catarina estão entre os elegíveis para participar da escolha do novo pontífice – e até mesmo para serem escolhidos como o novo chefe da Igreja. Entre os nomes catarinenses, está Dom João Braz de Aviz, natural de Mafra. O cardeal já havia sido cotado no conclave de 2013 e volta a ser mencionado como um dos possíveis papáveis.
Em entrevista à Vatican News, serviço oficial de informação da Santa Sé, o cardeal refletiu sobre o pontificado de Francisco e os caminhos para o futuro da Igreja.
“Agora o que a gente quer é realmente pedir a Deus a graça de que este papa interceda, o papa Francisco interceda por nós, para que a gente possa desenvolver este ideal evangélico o mais possível na direção do que ele nos indicou e do que ele testemunhou”, afirmou dom João.
Ele foi nomeado presidente da então Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica em 2011, pelo papa Bento XVI. Com a eleição de Francisco, em 2013, foi confirmado no cargo, que ocupou até janeiro deste ano.
Para dom João, a “fortíssima experiência da misericórdia de Deus” é uma das principais marcas deixadas por Francisco.
O papa mostrou que “Deus é aquele com o qual eu posso contar quando eu errei tudo”, disse o cardeal. “Eu posso contar com Ele. Ele me acolhe. Ele é a única porta que ainda permanece aberta. E isso, na formação da gente, às vezes faltou em algumas coisas, em algum momento, ou não foi completa”.

Ele também ressaltou que “o papa Francisco não deixou dúvidas sobre isso”. “A misericórdia de Deus é tudo, é tudo, e se a Igreja se tornar misericórdia, como o papa foi misericórdia, não sei, há tanta experiência para o mundo, de fato, há como agora um olhar positivo sobre a missão da Igreja por causa desta atitude”, completou.
O cardeal falou ainda sobre a importância de seguir o exemplo de amor aos pobres deixado por Francisco. “Aqueles que são os abandonados, deixados de lado, que estão nas nossas ruas, que não têm mais oportunidade, que não podem cuidar da sua saúde, que não podem comer, que não podem ter paz, que são mortos. Nós precisamos, a Igreja precisa, como ela está fazendo, mas ela precisa acentuar isso mais”, destacou.
Em janeiro, dom João foi sucedido no dicastério pela irmã Simona Brambilla, nomeada pelo papa Francisco. Ela é a primeira mulher a ocupar o cargo de prefeita em um dicastério da Cúria Romana.
O cardeal agradeceu pela escolha: “Agradeço a Deus, porque ficou no nosso dicastério a indicação de uma luz possível que o papa fez com toda a Igreja”.
Para ele, a valorização do papel da mulher é um dos grandes marcos do pontificado. “Papa Francisco tinha um olhar para a mulher de um modo muito profundo, tanto que ele dizia, a Igreja é mulher”, afirmou. “A gente viu crescer a figura da mulher”.
Segundo dom João, “a mulher é o centro da vida”, tanto que Jesus “quis nascer de uma mulher” e “aí está o auge de tudo”. “Essa mulher se fez pequena para poder conter esse Deus tão grande, um mistério tão grande”, disse.
“Maria vai ficar sempre na história como o lugar da mulher. É esse o lugar da mulher, é o lugar de Maria, é o lugar daquela que está colaborando, que está codividindo, que está dando o exemplo, que não está impondo. E eu acho que isso nós temos que integrar muito de novo”, completou.
O cardeal também destacou como o papa Francisco tratou a vida consagrada durante seus doze anos de pontificado. Para dom João, que esteve à frente do dicastério durante a maior parte desse período, o papa resgatou o sentido profundo da vocação religiosa.
“O papa Francisco nos fez voltar à busca de uma experiência profunda de Deus”, disse. Segundo ele, é preciso ser “testemunhas desse amor de Deus” e buscar “conquistar essa vida fraterna entre nós nas comunidades, na consagração”.
“Depois, não viver para nós mesmos, mas sair de dentro, digamos assim, das nossas paredes, de dentro da nossa estabilidade de vida, ir ao encontro do povo, porque essa é a marca do papa, o papa nunca quis estar sozinho, ele nunca quis viver sozinho”, afirmou.
Ao lembrar da última Páscoa, dom João ressaltou que Francisco “acabou morrendo praticamente no meio do povo”, após dar a bênção Urbi et Orbi e percorrer a praça de São Pedro em papamóvel, em meio à multidão.
Nascimento e carreira religiosa
O religioso nasceu na localidade de Avencal do Meio, em Mafra, em 24 de abril de 1947. Ingressou no seminário em 1958 e cursou Filosofia e Teologia, concluindo doutorado em Teologia Dogmática em Roma. Ordenado padre em 1972, exerceu diversas funções pastorais e acadêmicas.
Em 1994, foi nomeado bispo auxiliar de Vitória e, posteriormente, bispo de Ponta Grossa (1998) e arcebispo de Maringá (2002). Em 2004, assumiu a Arquidiocese de Brasília, onde organizou o XVI Congresso Eucarístico Nacional e atuou na CNBB.
Em 2011, foi nomeado prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica, no Vaticano. No ano seguinte, tornou-se cardeal, recebendo o título pelas mãos do Papa Bento XVI.
Sequestro e tiro de escopeta
Dom João viveu um momento dramático em sua vida. Em outubro de 1983, foi sequestrado e baleado durante uma tentativa de assalto, mas conseguiu sobreviver.
Na época, quando seguia para uma igreja no norte do Paraná, foi obrigado a parar em uma ponte por um grupo de assaltantes que se preparava para roubar um carro-forte. O religioso não se identificou como padre e permaneceu refém até a chegada do veículo.
Ao interceptar o carro-forte, os criminosos dispararam com revólver calibre 38 contra os pneus, obrigando o motorista a parar. Em seguida, forçaram o padre a pedir dinheiro aos ocupantes do veículo. Durante a ação, um dos seguranças do carro-forte atirou contra ele a uma distância de 30 metros. O disparo de escopeta espalhou chumbo em várias direções, atingindo diversas partes de seu corpo, entre os olhos e o tornozelo. Os assaltantes fugiram.
Como é o conclave?
O conclave é o processo que define o novo papa após a morte ou renúncia do pontífice. A eleição ocorre entre 15 e 20 dias após a vacância do cargo, reunindo cardeais com menos de 80 anos na Capela Sistina, no Vaticano.
Para ser escolhido, um candidato precisa de pelo menos dois terços dos votos. Se não houver consenso, novas votações são realizadas diariamente, intercaladas com momentos de oração. Caso a indefinição persista, a disputa se restringe a dois finalistas para uma votação decisiva.
O resultado é anunciado por meio da fumaça que sai da chaminé da Capela Sistina: preta indica que ainda não há um eleito, enquanto branca confirma a escolha do novo papa.
Durante todo o processo, os cardeais permanecem isolados e sem comunicação externa, garantindo total sigilo. O novo pontífice é apresentado ao mundo na sacada da Basílica de São Pedro, marcando o início de seu papado.
Com informações da Vatican News.