Ministério Público de SP propõe acordo a Pablo Marçal para encerrar processo sobre expedição no Pico dos Marins


Acordo pede o pagamento de R$ 273.240,00, a ser destinado para entidade pública ou privada com destinação social, equivalente a 180 salários-mínimos Imagem de arquivo – Pablo Marçal no Pico dos Marins, no interior de SP
Reprodução/Instagram
O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) propôs um acordo para encerrar o processo envolvendo o influenciador digital e empresário, Pablo Marçal (PRTB), que o acusou de colocar em risco a vida de pelo menos 32 pessoas durante uma expedição ao Pico dos Marins, em Piquete, no interior de SP, em 2022.
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Marçal foi denunciado 32 vezes com base no artigo 132 do Código Penal, que trata de “expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente”.
Apesar da denúncia, o MP propôs a possibilidade de transação penal – uma espécie de acordo para evitar o processo criminal. O acordo pede o pagamento de R$ 273.240,00, a ser destinado para entidade pública ou privada com destinação social, equivalente a 180 salários-mínimos.
No dia 13 de março, a Justiça deferiu o pedido feito pelo MP e estabeleceu um prazo de 15 dias para que a defesa de Marçal se manifeste se há interesse na transação penal. Ainda não há uma resposta da defesa.
Em caso de não manifestação no período, o processo deve ter uma nova decisão da Justiça, se acata ou não a denúncia.
O g1 acionou a defesa de Marçal e o Ministério Público de São Paulo. A reportagem será atualizada assim que eles se manifestarem.
A denúncia
No documento, o MP cita que Marçal coordenou a expedição nos dias 4 e 5 de janeiro de 2022, em um período considerado crítico para a subida ao Pico e sob a alegação de que as pessoas precisavam encarar a escalada para vencer na vida.
“[…] o denunciado capitaneou uma incursão com dezenas de pessoas (aproximadamente sessenta seguidores) na Serra da Mantiqueira (no local conhecido como Pico dos Marins), o fazendo propositadamente num período contraindicado a tanto (ou seja, fora da ‘temporada de montanha’), nas mais adversas condições de tempo, sob o infundado pretexto de que as vítimas por ele guiadas precisariam correr riscos, enfrentando a natureza hostil daquele período, sem o que não seriam capazes de vencer e prosperar na vida”.
Mesmo com mal tempo, coach insistiu em continuar caminhada até o Pico dos Marins
Ainda de acordo com o MP, Marçal e seus seguidores saíram da base do Pico dos Marins em grupos distintos, mas, durante o trajeto, a chuva aumentou, além de neblina, vento forte e pouca visibilidade.
O documento prossegue apontando que os seguidores se reuniram próximo ao Morro do Careca e que Marçal apontou os próximos passos do grupo, sendo que um dos guias contratados por ele alertou que “era inviável prosseguir, advertindo-o dos riscos”.
“Contudo, o denunciado desdenhou dos avisos e chamou o guia de ‘covarde’, conclamando aos presentes que o seguissem (donde 32 pessoas atenderam tal chamado), expondo, assim, a vida e saúde de todos aqueles que o acompanharam a perigo direto e iminente (inclusive de morte)”, continuou a promotoria.
Imagem de arquivo – Marçal ironiza quem classificou como irresponsabilidade a subida
Divulgação
Alguns dos seguidores desistiram da ideia de tentar chegar ao cume e resolveram retornar à base do Pico dos Marins. No entanto, o grupo de 32 pessoas que resolveu seguir continuou enfrentando condições adversas, segundo o MP, como rajadas de ventos de 100 km/h e visibilidade de, no máximo, 10 metros.
Na madrugada do dia 5 de janeiro, por volta das 4h, um dos seguidores que prosseguiu na escalada resolveu pedir socorro e conseguiu contato via rádio com o guia que havia sido contratado por Marçal — e que foi chamado de ‘covarde’ pelo empresário.
O Corpo de Bombeiros iniciou a procura pelo grupo por volta das 6h do dia 5 e, depois de cerca de duas horas de caminhada, os bombeiros encontraram o primeiro grupo — de 14 pessoas –, distantes a 1,5 km do cume do Pico dos Marins.
Segundo o MP, eles estavam “sem nenhum guia, com roupas inapropriadas para a travessia e encharcadas, parcialmente acampados fora da trilha do Pico dos Marins, os quais foram localizados pelos gritos, todos psicologicamente abalados”.
Bombeiros mobilizaram operação para resgatar 32 turistas no Pico dos Marins
Corpo de Bombeiros/Divulgação
Esse grupo então desceu para a base com uma parte da equipe dos bombeiros, enquanto a outra equipe seguiu à procura do restante do grupo de Marçal — que foi localizado após 1 hora.
“Daí em diante, os bombeiros finalizaram o socorro aos dois grupos perdidos no Pico dos Marins, donde os 32 integrantes estavam à mercê de perigo direto e iminente, com risco à vida e saúde, por uma expedição coordenada e idealizada pelo denunciado”, completa o MP.
Expedição
A jornada foi toda registrada nas redes sociais de Marçal e, nos vídeos, é possível ver que, já na saída para a caminhada, as condições climáticas não eram apropriadas. Mesmo assim, Marçal insistiu na continuidade da expedição, chamando uma oração para que Deus pudesse “parar o vento”.
“Eu sei no meu coração que dá pra subir. Vai ser a pior experiência de todas. Nós sabemos que, do jeito que está aqui, não dá para subir. Mas uns pararam o sol, outros voltaram o tempo. A gente não tá pedindo nada disso. Só estamos pedindo para o Senhor desviar o vento”, afirmou Marçal na oração.
Ele compartilhou vídeos que mostram as pessoas relatando cansaço, frio e querendo desistir da “expedição” enquanto eram convencidas por ele de que a circunstância “era uma chance de crescimento” e que era preciso “vencer os medos”.
‘Quem não quer correr risco fica em casa vendo stories’, disse Marçal
Críticas dos bombeiros
À época, os bombeiros que participaram do resgate criticaram a ação de Marçal e afirmaram que “ele foi totalmente irresponsável” na condução do grupo. A subida do Marins é recomendada apenas nos períodos de estiagem (meses de abril a agosto), com guia e equipamentos de segurança.
“Ele foi totalmente irresponsável. Subir com um grupo de pessoas despreparadas e sem equipamento é colocá-las sob risco de morte. Essa foi a pior ação que a gente viu no Pico dos Marins”, afirmou Paulo Roberto Reis, capitão dos Bombeiros na ocasião e chefe da operação de resgate.
Bombeiro critica ‘expedição’ de Coach no Pico dos Marins que terminou com 32 resgatados
Reprodução
Pico dos Marins
O Pico dos Marins é um ponto turístico muito procurado para a prática de montanhismo. A recomendação é a de que a atividade seja feita nos períodos mais secos do ano, entre abril e agosto.
Pico dos Marins, em Piquete (SP)
Reprodução/Jornal Nacional
Os bombeiros orientam que as pessoas não entrem no local sem supervisão de guia profissional, porque a trilha é complexa, com histórico de pessoas perdidas e até mortes.
O caso mais emblemático é o do desaparecimento do escoteiro Marco Aurélio Simon. Em junho de 1985, ele e mais três amigos tentavam alcançar, na companhia de um líder, o cume do Pico dos Marins. No trajeto, um dos meninos torceu o pé e Marco Aurélio, então com 15 anos, voltou para buscar ajuda. Mas o garoto nunca retornou e não foi mais visto. As buscas duraram 28 dias.
O pico tem 2,4 mil metros de altitude e é o quarto maior de todo o Estado de São Paulo. Para chegar ao cume, é preciso passar por uma trilha de terra em que o nível de acesso é considerado de médio a pesado.
O tempo de escalada é longo – ida e volta varia entre sete a oito horas, considerando o período de uma hora de visitação no pico. Ir ao Pico dos Marins exige um bom condicionamento físico dos turistas.
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