Série IHGT Presente: Padre Luiz Gonzaga Freury e o adiamento do sonho tocantinense

Padre Luiz Gonzaga de Camargo Freury

Pe. Luiz Gonzaga de Camargo Freury
(Natural de Meia-Ponte, GO. n. 21/06/1793 – f. 29/12/1846)
Sacerdote católico, membro da Junta Governativa de Goiás (1822-1824), editor de A Matutina Meiapontense (1830-1834) e Presidente da Província de Goiás (1837-1839)

Luiz Gonzaga de Camargo Fleury foi sacerdote católico, comendador e Cavaleiro da Ordem Imperial do Cruzeiro e o 5º presidente da Província de Goiás. Conhecido como Padre Fleury, ou Padre Gonzaga, nasceu no arraial goiano de Meia Ponte, hoje Pirenópolis e foi batizado na Matriz de Nossa Senhora do Rosário, em 13/07/1793, pelo padre Joaquim Gomes Lima, sendo-lhe padrinhos, os avós maternos, guarda-mor José Cardoso de Camargo (natural da freguesia de São Sebastião, bispado de Mariana, Província de Minas Gerais) e Mecia Bueno da Fonseca (natural de Parnaíba, Província de São Paulo).

De acordo com Jarbas Jayme (1943), recebeu Gonzaga, de seus pais, salutar educação: “procuraram eles indufundir-lhe, no coração infantil, o temor a Deus e o amor ao próximo, a caridade e, enfim, todas as virtudes cristãs, que ele soube praticar, respeitar e difundir, durante sua vida laboriosa e dedicada a Deus, à Pátria e a Goiás. Em tenra idade, a par da altivez de seu gênio e independência de seu caráter, se manifestara a pureza das intenções, a revelar o varão ilustre que haveria de ser. A modéstia, a afabilidade e a prudência foram predicados que lhe granjearam amigos e admiradores”.

Estudou com o professor e poeta Bartolomeu Antônio Cordovil, onde aprendeu o latim e o francês, estudos mais tarde completados com o professor José Joaquim Pereira da Veiga. A fim de dedicar-se à vida sacerdotal, mudou-se para São Paulo, onde cursou filosofia e teologia, e recebeu as ordens de presbítero do hábito de São Pedro em 25 de julho de 1817. Retornou à sua terra depois da ordenação e, com a mente repleta dos ideais liberais que varriam a Europa, ingressa na política local. Sempre foi ligado à vida política, motivo pelo qual sua vida religiosa ficou em segundo plano e ele manteve o cargo de pároco-coadjutor de Pirenópolis.

August Saint-Hilaire (1975), que visitou o Arraial de Meia Ponte em 1819, quando Padre Gonzaga contava com 26 anos, relata que, “antes de deixar o arraial (17 de junho), fui apresentar minhas despedidas ao vigário e ao jovem Padre Luiz Gonzaga de Camargo Fleury, que eu já havia visto em sua companhia em Corumbá. Durante minha permanência em Meia-Ponte, ambos me tinham cumulado de gentilezas. Fizeram-me várias visitas, durante as quais conversamos, demoratamente. Luiz Gonzaga era de origem francesa, como indicava seu nome de família. Tinha perfeita noção dos deveres que o sacerdócio lhe impunha e, de um modo geral, achei-o bastante culto. Conhecia nossos bons autores franceses, lia muito uma de nossas histórias eclesiásticas e tinha algumas noções da língua inglesa. O vigário, que era ao mesmo tempo, vigário da vara, reservara para si, unicamente, esta última função, dividindo a missão de conduzir suas ovelhas com o Capelão de Corumbá, com o do Córrego de Jaraguá e, finalmente, com Luiz Gonzaga, a cujo cargo ficava Meia-Ponte”.

Esses elogios, vindos de Saint Hilaire, crítico mordaz dos costumes e da vida brasileira, têm um significado especial. Mostra o elevado nível cultural do Padre Gonzaga Fleury. Ressalte-se que o naturalista francês enganou-se com a origem de Padre Gonzaga, sabido, hoje, que os Fleurys de Goiás não são os mesmos da França (vide Jarbas Jayme – “Vale Seis!”, e José Sisenando Jayme – “Origem da Família Fleury”).

Como a Província de Goiás se encontrava à época varrida por revoltas internas, a corte de Portugal determinou que ali se criasse a Junta Governativa de Goiás, um governo provisório, da qual o padre Gonzaga tomou posse em 08/01/1822, governando até 14/09/1824. Com o advento da Independência do Brasil, aumentaram as revoltas nas regiões mais afastadas de Goiás, devido ao abandono a que fora relegada. O norte da Província se tornou, àquela época, um lugar de muita discórdia e desordem, chegando, inclusive, a determinar a separação de Goiás e a elevar o arraial de Natividade à categoria de vila capital da Província de Tocantins, subordinada à Coroa Portuguesa, e não ao Brasil.

A intenção do imperador do Brasil era a de enviar soldados para esmagar aquele conflito, que desafiava os primeiros tempos do seu governo. Porém, a junta provisória de Goiás criou um pequeno exército para escoltar padre Gonzaga até a região do conflito e assim procurar debelar as revoltas, sem derramamento de sangue. Padre Gonzaga chegou a Cavalcante em 20 de janeiro de 1823, prendeu o coronel local, Teotônio Segurado, e o enviou à capital, Vila Boa, hoje Cidade de Goiás. Dali prosseguiu para Natividade, a capital dos revoltosos, onde adentrou com as bênçãos do povo humilde da região e, pregando o Evangelho, narrando a realidade nacional, contando da inviabilidade do projeto de emancipação do norte, conseguiu convencer os insurretos a abandonar seus propósitos.

Retornou para casa e foi congratulado pelo êxito de sua missão, sem derramar uma gota de sangue ou perder qualquer vida. No entanto, em agosto daquele mesmo ano, novos conflitos na fronteira com o Maranhão requereram sua presença, e ele novamente conseguiu impor a paz através da calma e persuasão, o que lhe garantiu uma entrada triunfal em Vila Boa, na data de 28 de maio de 1824. Devido à sua capacidade de agregação, recebeu a alcunha de “Pacificador do Norte”.

Na data de 14 de setembro de 1824, foi dissolvido o governo provisório e Caetano Lopes Gama assumiu a administração da Província, elegendo o padre Gonzaga para membro do Conselho Administrativo Provincial. Em 05/03/1830 foi fundado pelo comendador Joaquim Alves de Oliveira o jornal Matutina Meiapontense e o padre Gonzaga ficou responsável por sua redação, tendo ali trabalhado até 1834.

A proclamação da Independência do Brasil não pôs fim às rivalidades entre brasileiros e portugueses, pois muitos lusitanos continuaram a morar na ex-colônia, o que culminou na célebre noite das garrafadas, ocorrida em 13 de março de 1831, depois na queda de D. Pedro I do Brasil, e por fim se espalhou por todo o país em sangrentos conflitos. A insegurança social era tamanha que diversos comerciantes portugueses abandonaram o Rio de Janeiro, o que começou a causar uma crise econômica. O jovem país corria perigo. Para acabar com esse preconceito entre povos irmãos, o Partido Moderado e o Partido Conservador se uniram para selar a paz, o que se deu em 28 de abril de 1831, através da fundação da Sociedade Defensora da Liberdade e Independência Nacional. Na província de Goiás, o padre Gonzaga e seu amigo, o comendador Joaquim Alves de Oliveira, fundaram em Meia Ponte, em 9 de janeiro de 1832, essa mesma sociedade, o que contribuiu para acalmar os ânimos que também se exaltavam na Província.

Na composição da primeira câmara municipal de Meia Ponte, padre Gonzaga foi eleito vereador, em 18 de novembro de 1832, e tornou-se seu secretário. Em 17 de janeiro de 1834, tomou posse no cargo de juiz municipal. Entre as datas de 20 de março de 1837 e 4 de setembro de 1839, foi nomeado pelo padre Diogo Antônio Feijó, seu grande amigo, para o cargo de Presidente da Província de Goiás.

De acordo com Ferreira (1980), o “pacificador do Norte”, hábil e diplomata, não foi muito feliz na administração da Província, devido a uma grande enchente na capital e finanças estatais precárias, que gerou atraso no salário do funcionalismo, criando um clima adverso para o governante. Esse autor ressalta, no entanto, que, durante seu governo, definiu-se a questão de limites com Mato Grosso e Maranhão, que tentavam alterar a linha divisória da fronteira. Usando seus altos conhecimentos de historiador e geógrafo, traçou a verdadeira fronteira histórica de Goiás, respondendo ao Aviso da Corte (7/06/1837). Criou a Provedoria da Fazenda Estadual (Lei n°16, de 04/12/1837), atual Secretaria da Fazenda Estadual. Criou, ainda, a Loteria da Provìncia de Goiás(Resolução n° 55 de 27/07/1837), com extração anual, cujos fundos eram destinados ao Hospital de Caridade São Pedro de Álcântara.

Ferreira (1980) relata que, após uma chuva torrencial que desabou sobre a Cidade de Goiás, a partir das 17 horas do dia 18/02/1839, o Rio Vermelho saiu de seu leito, na madrugada do dia 19, destruindo as habitações vizinhas e carregando todas as pontes que ligavam o distrito de Santana ao Carmo. A Igreja da Lapa, que se erguia no mesmo lugar em que se encontra, hoje, a Cruz de Anhaguera, foi levada pela correnteza. O Córrego Manoel Gomes ficou represado, invadindo as casas da rua Moretti Fóggia. A residência do sr. Sebastião de Camargo (onde está, hoje, o Cine São Joaquim) foi totalmente tomada pelas águas que, entrando pelas portas do fundo, saíam em cascatas pelas janelas. Os habitantes se revoltaram, imputando ao Presidente a culpa pela enchente, fruto da “ira divina” contra os governantes. Uma nota estampada no Jornal do Comércio contra o Presidente, que se recusara, por doente, a tomar parte na Assembléia Legisltativa, levou o governo central a substituir o Padre Gonzaga em 04/09/1839 (Ferreira, 1980).

Faleceu em Meia-Ponte, em 29 de dezembro de 1846, sendo sepultado debaixo do altar de Nossa Senhora das Dores, na igreja Matriz de sua terra natal. Padre Gonzaga deixou numerosa descendência, que se espalhou por todo o Estado de Goiás, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Tocantins e muitos outros.

Com a sobrinha-neta do padre Diogo Antônio Feijó, Maria Palhares Fernandes, teve Maria Teolinda Fleury, que assistiu à coroação de D. Pedro II, em 18 de julho de 1841, na companhia do pai. Com Luíza Leandra Leal, teve Luíza Catarina Leal (n. Cidade de Goiás, 25/11/1833 — f. 07/03/1925). Com sua conterrânea Genoveva Maria da Soledade (Inhá Genu), (n. 27/11/1807 – f. 15/01/1882), teve: Rosa Epifânia Gonzaga de Sá, João Gonzaga Jaime de Sá (“Seu Jaime”), Luiz Gonzaga Confúcio de Sá (“Seu Confúcio”), Antônio Gonzaga Sêneca de Sá Fleury (“Seu Sêneca”), José Gonzaga Sócrates de Sá (“Seu Sócrates”), Francisco Gonzaga Cícero de Sá (“Seu Cícero”) e Rosa Maria de Lima. O Pacificador do Norte foi o patriarca, portanto, de cinco novas famílias goianas: Jaime, Confúcio, Sêneca, Sócrates e Cícero.

Nilson Gomes Jaime

Sócio-fundador da Cadeira n° 2
Nilson Gomes Jaime
(Natural de Palmeiras de Goiás, GO, n. 15/04/1962)
Engenheiro Agrônomo, mestre e doutor em Agronomia. Escritor. Auditor fiscal da Receita Estadual da Secretaria da Fazenda do Tocantins

Nilson Gomes Jaime é goiano de Palmeiras de Goiás, onde nasceu em 15/04/1962. Doutor em Agronomia (2010), engenheiro agrônomo (1984) e mestre (2005) em Agronomia pela Universidade Federal de Goiás. Lecionou nesta universidade por cinco anos (1985-1987 e 2002-2003), para os cursos de Agronomia, Engenharia de Alimentos e Nutrição. Foi Professor de Matemática e Estatística da Secretaria de Educação do Estado de Goiás (1981-1984), secretário de Administração e Planejamento da Prefeitura de Palmeiras de Goiás (1992-1994); Diretor por duas vezes da Escola Fazenda de Araçu, do Governo de Goiás (1988-1889; 1995-1998) e da Escola de Formação de Maquinistas Agrorodoviários de Goiás –Efomargo (1989-1991).
Escritor, é sócio titular do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás – IHGG (cadeira n 6, patronímico de Zoroastro Artiaga); sócio-fundador da Academia Palmeirense de Letras, Artes, Música e Ciências – Aplamc (Cadeira n 5, patronímico de Jarbas Jayme), da qual é presidente (2020-atual); da Academia Pirenopolina de Letras, Artes e Música – Aplam (cadeira n 9, patronímico de Silvino Odorico de Siqueira); da Academia Goianiense de Letras – AGnL (cadeira n 3, patronímico de Jarbas Jayme) e do Instituto Cultural e Educacional Bernardo Élis para os Povos do Cerrado – Icebe (cadeira n 3, patronímico de Leolídio Di Ramos Caiado), ocupando o cargo de presidente a partir de setembro de 2022.
É sócio-fundador e primeiro presidente da Sociedade Goiana de História da Agricultura (SGHA); sócio-fundador e vice-presidente (2024-2028) do Instituto Histórico e Geográfico do Tocantins (IHGT); vice-presidente da Associação Goiana de Imprensa (AGI); membro efetivo do Colégio Genealógico Brasileiro (CBG), Rio de Janeiro; e associado do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA-GO).
Tem experiência em tecnologia de alimentos, nutrição de plantas, perícia agronômica e ambiental, entomologia, História de Goiás e genealogia. Elabora projetos de implantação de indústrias de alimentos em geral. Realiza análise de viabilidade financeira e presta consultoria e assessoria a indústrias de alimentos, especialmente a usinas de açúcar, frigoríficos de suínos e bovinos, fábricas de doces e engarrafadoras de água mineral nas seguintes áreas: gestão da qualidade alimentar; implantação de programas de Boas Práticas de Fabricação (BPF); implantação de Boas Práticas Agropecuárias (BPA); implantação de programa de Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC); implantação de 5S, ISO 22.000, Auditoria da qualidade e colheita e processamento de frutos do Cerrado. Prestou consultoria às principais usinas de açúcar do Estado de Goiás, entre 2002 e 2016. Realizou pesquisas com levantamento da biodiversidade de formigas urbanas e sobre a utilização desse grupo de insetos como indicadores ambientais.

É auditor fiscal da Receita Estadual do Estado do Tocantins, concursado, tendo tomado posse na capital, Palmas, em Julho de 1994. Trabalhou nas Delegacias Estadual da Receita em Palmas, Gurupi e Alvorada. Com 44 anos de contribuição previdenciária na esfera pública, faz jus à aposentadoria há quatro anos, mas continua na ativa, desenvolvendo sua atividade de auditor fiscal no Estado do Tocantins. Foi consultor e instrutor do SEBRAE-GO e das empresas ALFA Consultoria Agronômica e Agroindustrial, da qual era sócio proprietário, e da Cerrado Consultoria Agronômica. Atualmente é sócio proprietário, não administrador, da Pyreneus Editorial e Distribuidora de Livros Ltda. Colaborador do Jornal Opção, de Goiânia.

Publicou os livros “Família Jayme: Genealogia e História (Goiânia: Kelps, 2016. 1148 páginas); “Frederico Jayme Filho: 50 anos de vida pública” (Goiânia: Antígona, 2018. 636 páginas) e “Resenhas e Ensaios” (Goiânia: Prime, 2019. 131 p.); “Manual Passo a Passo das Quatro Operações” (Kelps,2001) com três edições esgotadas, além de participação como autor de capítulos em outras doze publicações. É idealizador, coordenador e editor-geral da “Coleção GOIÁS +300, Reflexão e Ressignificação”, que já editou seis livros (História, Geografia, Memória e Patrimônio, Povos Originários, Literatura, Cronistas e Viajantes) e está editando outros doze livros, a serem publicados até 2026.

BORGES, Humberto Crispim. O Pacificador do Norte. Goiânia: Cerne, 1984. 188 p.
FERREIRA, Joaquim C. Presidentes e Governadores de Goiás. Coleção Documentos Goianos, v. 5. Goiânia: Ed. UFG, 1980. 188 p.
JAYME, Jarbas. Cinco Vultos Meiapontenses. Palmeiras: Ed. do autor, 1942. 115p.
JAYME, José Sisenando. Origem da Família Fleury. Goiânia: ed. Do autor, 1990. 264 p.
JAIME, Nilson. Família Jayme: Genealogia e História. Goiânia: Kelps, 2016. 1.148 p.
SAINT-HILAIRE, Auguste. Viagem à Provínicia de Goiás. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Ed. Da USP; 1975.

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