Como os enredos das escolas de samba retrataram o Brasil desde 1960


Evolução dos temas foi debatida no 1º programa da série ‘Apoteose do Samba’, que conta a história dos desfiles. Como os enredos das escolas de samba retrataram o Brasil desde 1960
Todo bom samba que embala uma escola na Sapucaí e abala as arquibancadas nasce de um enredo. E a escolha desse tema acaba retratando como a agremiação vê o Brasil.
Neste sábado (15), a TV Globo exibiu para o Rio de Janeiro o 1º episódio do especial “Apoteose do Samba — Carnaval de lá para cá”, sobre as mudanças nos desfiles ao longo das décadas.
Tia Surica, Neguinho da Beija-Flor e outros bambas se reuniram numa resenha sobre essa evolução — no ritmo e nos temas. Ao mesmo tempo, Milton Cunha entrevistou o pesquisador Leonardo Antan sobre os enredos ontem e hoje.
“A escolha do enredo é um grande momento de definição do que a gente vai cantar. Escolas de samba são retratos da sua época. São momentos de reflexões do povo negro, do povo brasileiro”, ensinou Antan.
Veja o que ele fala sobre cada década.
Desfile da Caprichosos de Pilares de 1985, ‘E por falar em saudade’
Reprodução/TV Globo
Anos 60 e 70
Foco nos movimentos sociais e, durante o regime militar, no onírico.
“Joãosinho Trinta pensou o sonho e o delírio como forma de fugir da ditadura, de pensar um outro amanhã”, disse Antan.
Um destaque dessa época foi o “Sonhar com rei dá leão” (1976) da Beija-Flor.
Anos 80
Confira o carnaval de 1982 do Império Serrano
Redemocratização. “Abertura irrestrita e democrática. A gente tem a Caprichosos de Pilares de Luiz Fernando Reis com ‘E por falar em saudade’” (1985), lembrou o pesquisador — esse samba marcou época com os versos “Tem bumbum de fora pra chuchu/ Qualquer dia é todo mundo nu”.
Milton Cunha acrescentou o “Bumbum, paticumbum, prugurundum” (1982) do Império Serrano de Rosa Magalhães e Lícia Lacerda: “É uma ode de amor ao tradicional.” “Elas criticam a ‘superescola de samba S/A’. É um momento de reflexão do que as escolas de samba querem ser, se tradicionais ou modernas”, comentou Antan.
Também nos anos 80 surgiram os enredos críticos, políticos e sociais. “Em 1988, no meio da Constituinte, Martinho da Vila diz que ‘a nossa kizomba é a nossa Constituição’. Isso é lindo”, comentou o pesquisador.
“E não podemos finalizar essa década sem falar de ‘Ratos e urubus’ (1989), esse embate entre a história oficial e a história oficiosa — ganhou ‘Liberdade, Liberdade’ (1989), que fala de Isabel, a heroína —, mas a gente tem ali Joãosinho Trinta lavando a Sapucaí com os seus mendigos”, descreveu Leonardo.
Anos 90
Relembre o desfile da Imperatriz no ano de 1995
“O triunfo de Rosa Magalhães”, sintetizou Antan. “A Rosa barroca da ‘história oficial’”. Ele cita os jegues vitoriosos de 1995 como destaque.
Anos 2000
“A gente vai ter a predominância da Beija-Flor”, lembrou Antan. “E mais uma vez acompanhando o tempo da sua época. O que estava acontecendo em 2000? Um momento econômico melhor para o Brasil, ante à inflação dos anos 80, e a gente vai ver uma serenidade de enredos”, explicou.
“Já não estão mais críticos porque está chovendo dinheiro nos enredos patrocinados”, emendou o pesquisador.
Anos 2010
Mangueira é a campeã do carnaval 2019 do Rio
Voltam os enredos críticos. “Em 2015, o Leandro Vieira estreia na Caprichosos de Pilares com ‘Na minha mão é mais barato’”.
Em 2019, naquele cenário político, tem de novo a questão dos movimentos sociais, trazendo ainda mais o debate do machismo, do racismo, da LGBTfobia. Isso tudo vai aparecer no desfile da Mangueira (Histórias para ninar gente grande)”, lembrou.
Anos 2020
Orixá Exu chega ao ‘topo do mundo’ em alegoria da comissão de frente da Grande Rio
Sobressaem as homenagens às religiões de matriz africana, como o Exu da Grande Rio de 2020. “Traz essa entidade para a conversa de rua”, destacou Milton.
“E a gente vai ter uma revolução da narrativa e da pesquisa”, pontuou Antan.
O 1º episódio também trouxe sambas icônicos e debateu como eram entoados no passado.
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