Fizemos um rasgo no cartão-postal!

Foi uma semana turbulenta. A começar pelo fato de ter-se registrado um calor intenso. Todo mundo pedia e procurava água. E sombra. E foi justo nessa hora que a cidade empenhou-se em… acabar com sombra. Uma das tipuanas da Marechal Floriano, no início da quadra em revitalização, escancarou, aos olhos de todos, nossa dificuldade (incompetência?) em gerir os recursos da arborização. Duas foram suprimidas, e ninguém duvida que sejam as primeiras de várias.

O resto da semana transcorreu em clima de tristeza. Pairava no ar uma espécie de luto. Até os mais desconectados do meio ambiente (talvez no íntimo intuindo que um limite havia sido ultrapassado) ficaram quietos. Sabe quando se rasga o cartão-postal? Fizemos um rasgo no do Túnel Verde, sem chance de usar fita adesiva. Não é o Túnel que tem de mudar; é nossa mentalidade. Na Redação da Gazeta, dezenas de mensagens foram recebidas. Um comparou o som da motosserra ecoando pelo centro a tiros em paredão de fuzilamento. “A gente se sente muito mal. O alvo somos todos nós”, arrematou. Outra foi enfática: “A cada dia nos mostramos mais eficientes e ágeis em derrubar árvores, e mais incompetentes para plantar e cuidar de uma só que seja! E dê-lhe aumentar a potência do ar-condicionado e o gasto de energia”.

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A repercussão foi intensa, porque mexeu com a alma e com o imaginário de gerações. Como referiu o professor Mateus Skolaude, na Gazeta do Sul de sexta-feira: o Túnel Verde ficou banguela. Tomou um gancho, direto no queixo. Quantos “dentes” mais sumirão? Que turista pagaria para visitar uma… cidade banguela? É dano irreparável contra o patrimônio coletivo. E o óbvio: a tipuana não caiu de “velha”, ou por ser frágil: o tronco evidencia que estava absolutamente saudável. Resistiu a todos os vendavais ao longo de décadas. Caiu porque pouco saudável está nossa sociedade, empenhada em romper raízes, e justificá-lo até com pequenos interesses, como “limpar” a fachada… Por que se ocupar tanto com fachada? E a essência?

Há quem argumente que tipuanas não seriam recomendáveis em cidades. Uma total inverdade. São altamente indicadas para arborização urbana, e compõem maciços famosos em Porto Alegre, Curitiba, São Paulo. Não se pode confundir arborização (ar puro, sombra) com ornamentação. Cita-se a extremosa, mas esta é um mero arbusto, para embelezar jardins ou espaços exíguos.

Por fim, um leitor da Gazeta apontou para discurso recorrente junto a alguns moradores: que as tipuanas causam “transtornos”. Propõe: “Quem sabe esses que não gostam das árvores não se transferem para rua no entorno, onde o pedestre pode torrar ao sol? Não brigam por lugar na Marechal Floriano justamente porque é o cartão-postal, onde se pode caminhar no frescor da sombra das tipuanas? Querem acabar logo com o maior atrativo da cidade?” Por sinal, ele sugere que no lugar das suprimidas sejam imediatamente plantadas outras (“e já de bom tamanho!”). Bom final de semana.

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