Nós, os condenados

Conta-se que, certa vez, um casal decidiu passar o dia à beira de um lago para fugir do stress. O marido, aficionado por pescaria, logo tratou de jogar seus anzóis na água. A esposa se refugiou numa sombra perto dele e se deliciava lendo um livro.

Após reiteradas tentativas e sem qualquer perspectiva de fisgar um peixe naquele ponto, ele avisou: “Vou para o outro lado. Aqui não dá nada!”. Pegou a vara, algumas iscas e se foi, deixando para trás a caixa de anzóis, linhas e equipamentos mais que pescadores costumam levar para a beira da água.

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Foi quando, conforme o conto, chegou o fiscal de algum instituto ambiental e intimou a senhora: “Você está numa área de preservação e preciso multá-la por prática de pesca ilegal”. “Como assim?” – protestou ela. “Eu não estou pescando. Estou lendo um livro”. O agente público insistiu: “Não está pescando agora, mas tem todos os equipamentos à mão e pode incorrer em prática criminosa a qualquer momento”.

Incrédula diante da situação, a mulher pensou por instantes e reagiu: “Muito bem! Então vou denunciá-lo por assédio sexual”. O fiscal protestou: “Como, assédio? Não fiz nada, só estou exercendo minha função e fazendo cumprir a lei”. Ao que ela retrucou: “Não está me assediando agora, mas tem todos os ‘apetrechos’ para fazê-lo a qualquer momento”. O fiscal se desculpou e foi embora.

Lembrei desta historinha porque dias atrás fomos no escritório da Corsan para saber por que estávamos recebendo avisos de débito por conta de “serviços básicos” prestados pela agora privatizada empresa. Para efeitos formais é o Grupo Aegea, mas para os consumidores continua sendo a Corsan, nome, por sinal, mantido pela nova gestora.

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O imóvel que gerou os supostos débitos não é nosso, está sendo inventariado e não é habitado há 12 anos, quando foi suspensa a ligação de água. Para nossa surpresa, agora tem um hidrômetro instalado na calçada, para qualquer desavisado ou mal-intencionado chutar e destruir e nos imputar o ônus de ressarcir a empresa. Mais: a Corsan agora está cobrando uma taxa mensal de R$ 34,90 porque, embora não forneça qualquer serviço, o imóvel já teve uma ligação de rede no passado e diante da presunção (lembram do fiscal que foi multar a esposa do pescador?) de que poderia passar a consumir água do sistema a qualquer momento.

Sabia disso? Está firmado na privatização feita pelo governo do Estado? A administração municipal passada que renovou o contrato por décadas compactuou com essa cláusula? Sim, imagino que isso deva estar especificado e, que eu saiba, não foi comunicado ao usuário, o povo que vai pagar a conta.
O que intriga é que procedimentos desse tipo, que “punem” o cidadão pelo que pode vir a praticar, são aceitos pelo sistema (vamos chamar assim) e não se aplicam a bandidos, ladrões, assassinos, corruptos, que estão amparados e protegidos pela presunção da inocência.

Em tempo: se você tiver problemas dessa ordem, vá ao escritório da empresa e será bem atendido. Por certo terá que pagar o que já lhe imputaram, como tivemos que fazer, e torcer que um marginal não destrua o hidrômetro que colocaram no passeio público. É assim que funciona agora.

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