Fui uma adolescente rebelde. E como toda adolescente rebelde, descontava minha confusão nos pais. No meu caso, mais especificamente, na mãe. Tivemos uma relação intensa e difícil.
Minha mãe, nascida sob o signo de Áries nos confins da Campanha gaúcha, não veio ao mundo para perder tempo. Era prática, decidida, sagaz e muito forte. Eu, uma geminiana viajandona, saí exatamente o oposto. Com um pequeno detalhe: aos 13, 14, eu não sabia disso. E, portanto, contrariava tudo.
Meu sonho de mãe, naquela época, eram as mães das minhas amigas. Todas donas de casa. Como eu queria – e dizia – uma mãe que cozinhasse, fizesse bolo, bordasse paninhos de prato e reunisse as vizinhas no fim da tarde para o chimarrão e a fofoca. Talvez até uma mãe que dispensasse a empregada e assumisse a casa com resignada submissão. Nada a ver com minha mãe. Nada a ver com dona Theresinha, que trabalhava fora, dirigia um carro esportivo e não aceitava ser mandada. Eu queria uma mãe careta. Uma mãe de anúncio de leite em pó. E não tinha.
Eu sei. Você deve estar pensando: “Credo, que guria chata”. Mesmo assim, me dê um desconto. Eu era quase uma criança e queria a mãe toda pra mim. E professava meu antifeminismo só com ela. De resto, assumia ares libertários e os direitos femininos. Contra a virgindade (acreditem, ainda se cobrava isso nos anos 70), contra o casamento, contra os rapazes comportados, contra o sutiã, contra o governo, contra o Papa…
A adolescência realmente é uma fase estranha. Para a jovenzinha mal saída do berço, todos os direitos. Para os adultos, todos os deveres. E haja paciência.
Foi preciso muita estrada e tombos para eu me tornar gente grande. Com o tempo, nos tornamos amigas e aliadas. E quando ela partiu, de forma abrupta e violenta em um acidente, fiz um luto de anos.
Como muitos de nós, compreendi melhor meus pais depois que os perdi. Hoje sei que todas as rusgas com minha mãe não eram rejeição, nem desamparo. Nem da minha parte, nem da dela. Eram só amor. Meu por ela. Dela por mim. Eu, com todo o egoísmo que cabe na juventude. E ela, algumas décadas à frente de suas contemporâneas.
Também entendi que a existência das mães não está a serviço dos filhos. Que uma mulher não vira mãe ao parir. Que a mãe santa é uma invenção da culpa, da cultura e da propaganda, pra dizer o mínimo.
ntendi que em cada mãe mora uma mulher com desejos e projetos e angústias e dores. Às vezes inclusive raiva e desprezo. Porque ali também mora a menina que ela foi um dia, os traumas, as pequenas fissuras de uma trajetória nem sempre feliz. E que antes de serem mães, as mães são pessoas. Iguais a todos em sua humanidade. Especiais para cada filho. Mas apenas pessoas.
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